quarta-feira, 30 de dezembro de 2009






















(ilustração de joana rosa bragança)

"Quando durmo não tenho sono" - este sono sempre tão acordado.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009























"On ne naît pas femme: on le devient."

Simone de Beauvoir, Deuxième Sexe

sábado, 26 de dezembro de 2009


































o natal em casa do avô.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

















um natal com o coração nas mãos, perto da boca.

(ilustração de raquel marìn)

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

(...)
nessa saudade absoluta
mil crianças nasceriam
só de nos vermos chegar.
(...)

sábado, 19 de dezembro de 2009






















que saudades destas cores que nunca cheguei a ver.


quarta-feira, 16 de dezembro de 2009


(ilustração de violeta lopiz)
o cansaço proporcional aos dias.

domingo, 13 de dezembro de 2009


















workaholic por falta de opção.

sábado, 12 de dezembro de 2009
























(Navidade, ilustração de Gustavo Aimar)

hoje o dia está limpo e claro e acho que afinal não estou doente, (as coisas que o cansaço nos dá para sentir!), por isso à tarde vou pela baixa, pela primeira vez este ano, fazer compras de natal.
tenho três trabalhos que valem ouro por fazer - um deles apenas começado - para entregar para a semana, mas preciso tanto de respirar.
sinto-me mesmo, mesmo feliz. e o dia está limpo e claro - mas já disse isto, não disse?


quarta-feira, 9 de dezembro de 2009
























(ilustração de raquel marín)

"A atitude estética em relação ao objectivo da vida oferece muito pouca protecção contra a ameaça do sofrimento, embora possa compensá-lo bastante. A fruição da beleza dispõe de uma qualidade peculiar de sentimento, tenuemente intoxicante."


Freud, 'O Mal-estar na Civilização'


às vezes o senhor até diz coisas bonitas.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

há dias em que a manhã cresce quarto adentro, corpo de mil braços e pernas enlaçados e largo devagar o peso da boca pelas palavras, como se por te cantar ao ouvido o mundo se aligeirasse de todas as perdas.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009























("Virgem matrioska", de Gustavo Aimar)

nunca esqueço que me faltam algumas bonecas por dentro.

sábado, 5 de dezembro de 2009

hoje:
primeiro, no TNSJ,





a seguir, jantarada num restaurante clandestino com amigos erasmus.

adoro quando a chuva me tenta a sair de casa.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009



quem disse que as manhãs de sexta a estudar na biblioteca não rendem?

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

não podia deixar passar o lindíssimo artigo 2º do Regulamento AGNU'09:






Art. 2º
(Os Valores)
Todos os participantes devem comportar-se durante o debate com lealdade e respeito, procurando seduzir e convencer a audiência num discurso formal, mas bem-humorado, competitivo mas não demagógico, aguçado mas não ofensivo, eloquente mas simples, responsável mas irreverente.

(e esta foi mais uma daquelas alturas que servem para duvidar seriamente do curso que escolhemos)

segunda-feira, 30 de novembro de 2009



(quadro de van gogh)

se van gogh fosse vivo corria e acordava-o à cabeceira da cama, dizia-lhe também sei o que é acordar cego no meio das searas, as cores a nascer e morrer demasiado rápido, como se nada estivesse mais perto que as luzes loucas destravadas da noite, sabes que também vejo tudo à roda às vezes, agarro-me com força ao estômago e penso sempre que não é pelo peso do mundo que os meus ombros se vão desmanchar, não é pela força centrífuga do amor que os telhados se perdem a caminho do céu. penso tantas vezes, hoje só queria uma flor de amendoeira.



(ilustração de justin gabbard)

há poucas coisas tão delicadas como o equilíbrio.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009
























(ilustração de justin gabbard)

algo recorrente por estes dias.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009



"...se morresse o contador de histórias, morreria a infância..."

N'As asas do desejo, de Wim Wenders

domingo, 22 de novembro de 2009

(a 'Flor da Saudade', no equinócio)


hoje é dia de saudade e de coisas que apertam, ainda mais, o coração.

sábado, 21 de novembro de 2009




o meu natal começou hoje, ainda que com todos os preparativos, às duas da manhã para ser mais exacta. e começou bonito.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

(ilustração de rachel caiano)


"Tentar, falhar, falhar de novo, falhar melhor". Beckett

quarta-feira, 18 de novembro de 2009



Espalhem a notícia, de Sérgio Godinho

fossem todos os dias de outono assim.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

A pedido de muitas famílias, o Nelson (finalmente!) enviou-me o texto que escreveu para a cerimónia dos Finalistas, e que leu nesse dia, perante gargalhadas de pais, irmãs, professores e funcionários - com o delírio dos alunos mais antigos, claro.
Conheço o Nelson desde os dois anos, foi o meu primeiro namorado a sério (com toda a seriedade com que se namora quando temos quatro anos) e um amigo de sempre. Está agora em Jornalismo, e confesso que se torna inevitável imaginá-lo daqui a uns anos com um cantinho de crónicas singulares, provavelmente muito dentro do género do que escreveu aqui.
Aqui fica um dos textos mais brilhantes que li e que nunca perde a graça, por muitas vezes que o leia: porque por muito sui generis que seja, uma casa nunca deixa de ser a nossa casa; e porque ainda dou por mim a procurar um pólo na gaveta antes de ir para a faculdade ou a dizer que vou 'para o recreio'.
Dedicado ao ano que saiu do Colégio no ano 2007/2008, e dum modo muito particular a todos os que partilharam tantos anos que ainda se conseguem lembrar da irmã Joaquina a sovar metade da turma, (todos em fila indiana para apanhar com o apagador do quadro), ou do tempo em que o recreio tinha um galinheiro e um lago com peixinhos:


Monólogo de um reabilitado


Tenho que avisar que se nas filas de trás não me conseguirem ouvir não importa, as filas de trás não serão tomadas em consideração.

No entanto se neste momento alguém estiver a gravar isto, não se esqueçam que eu recebo 20 % por cento da venda de DVDS a 5 e 99 euros, legendas em dinamarquês, inglês, e mandarim, documentário detrás das cenas e edição de coleccionador.

Quero antes de mais revelar uma coisa, algo que me está a roer por dentro e que consegui guardar durante muito tempo. A verdade é que agora que acabei o 12º ano posso dizê-lo finalmente, a verdade é que... Não sei ler. Era algo que eu queria partilhar convosco neste momento especial, a verdade é que eu sou uma fraude, todos aqueles testes, perguntas, idas ao quadro, tudo inventado, tudo copiado. Eu sou a prova viva de que o ensino português resulta e sinto-me capaz de enfrentar o mundo agora, vou é provavelmente ter algumas dificuldades.

Vou passar agora a fazer uma série de perguntas pessoais à gente da primeira fila, é só descer do palco...Na, tou a brincar é só para vos assustar, é preciso também impor respeito ao público, não se preocupem.

Vou agora descrever-vos a experiência tenebrosa que um jovem de 6 anos enfrentou quando foi incluído nesta instituição, nada de negativo, pronto talvez algumas coisinhas. A começar pelo facto de que mal chego na primeira aula da 1ª classe me prometerem que ia ser enviado para a sala dos golfinhos, não é a minha surpresa quando me enviam para a sala dos Cogumelos, confesso que fiquei bastante irritado quer dizer os Golfinhos ainda é aquela coisa macha saltam na água e tudo e riem-se de maneira fofinha, agora Cogumelos vamos lá ver, a única coisa de fixe num cogumelo é se for venenoso ainda pode dar cabo de um caçador ignorante e mais nada.

De resto esta instituição já na altura nos idos anos 90, assemelhava-se de maneira estranha a uma instituição prisional, muros, arame farpado, seguranças de negro, a falta de cor por motivos religiosos um pouco tenebrosos, campos de futebol interior, digamos que é bastante parecida com Custóias só que vá lá aqui ainda nos deixavam fazer picotados e desenhos com massas, e em vez de droga havia tazos. Mas havia chibos claro, a gente até dizia com aquele jeito infantil de dizer “és chibo morres”; pronto tá bem, não era bem assim, no máximo roubávamos-lhe os tazos e o bolicao.

Quando aos seguranças, as nossas queridas irmãs acredito que tivessem boas intenções mas a verdade é que me lembro perfeitamente de uma vez quando caiu um miúdo das escadas, 5 minutos depois já se dizia que tinha sido uma irmã a empurrá-lo, e ainda por cima riu-se
a sacana. Mas isso são coisas de miúdos, já somos pessoas maduras, mas ainda tenho algum medo de descer as escadas com a irmã Dulcida à beira.

Tínhamos um bonito uniforme todo verdinho e cor-de-rosa que não hesitei em usar para remendar a toalha da mesa, só para me lembrar destes bons tempos à refeição.

Jogávamos futebol num campo de areia e granito que era uma maravilha para cairmos e nos esfolarmos todos, e claro só íamos à enfermaria em caso de fractura exposta conhecendo as experiências que lá se faziam com quem se queixava.

Quanto ao facto de ser um colégio religioso, nada contra, mas infelizmente este vosso criado é um ser não baptizado, a minoria silenciosa, mas era giro, não havia discriminação, bem só talvez quando era para nos confessarmos e comer a hóstia. Lembro-me de que sempre que íamos a uma dessas missas o discurso era sempre o mesmo da irmã Joaquina, “ Ok meninos todos para aqui para o lado, vamos lá, deixem de ser bebés.” E virava-se para mim e dizia”Pois é Nelson, estou haver que ainda temos o pequeno problema, vai ali para o cantinho vai”. “Mas oh irmã eu gostava de me confessar” “Não tás a perceber pois não? vai lá para o cantinho” “Mas o Tiaguinho agrediu um professor e tá ali a confessar-se” “Pois, mas o tiaguinho é um filho de Deus, vai lá, vai lá” e eu lá ia para a bancada do canto, que com a irmã Joaquina não se brinca, a pensar como é que entrava pró clube.

Então iniciei uma busca pessoal da fé, agora quando a minha mãe me perguntou se queria bandas desenhadas do Tio Patinhas ou do Pato Donald eu dizia que queria era a Bíblia, e lá ficava a minha mãe a perguntar-se em que é que errou e que desenhos animados andava o puto a ver. Mas a verdade, como sei agora, é que aprendi muitas coisas úteis com o Tio Patinhas, nomeadamente que explorar a família para fins lucrativos é fixe e recomendável.

Recebi então uma Bíblia ilustrada muito bonitinha e fiquei um pouco assustado ao verificar que Deus era um pouco como aqueles vilões do Dragonball, esta aldeia está entregue ao pecado, pimba bola de fogo em cima, um livro só um pouco pesado e talvez com personagens a mais.

Mas a minha vontade de me integrar naquele grupo exclusivo era tanta que até me levou a esgueirar para uma aula de catequese só para ver o que era. Fiquei então à espera de grandes revelações, quando a catequista nos diz que o trabalho de hoje era fazer uma banda desenhada de Jesus a curar os leprosos. Quer dizer, era isto que eu tanto cria? Como não sabia como era um leproso simplesmente fiz um monte de homenzinhos verdes a quem Jesus chegava e devolvia a cor, material muito inspirador.

Mas continuando sobre a escola, é verdade que foram muitos os bons tempos nessa altura da batinha, as aulas de música que acabavam com tudo à luta com as flautas, a casinha que era tipo o mercadozinho tradicional onde comíamos bolas de Berlim, esmagada pela vinda do bar tipo MacDonalds. Os dias de chuva no pavilhão de pedra, a nossa própria capoeira, os Carnavais meio loucos, os magustos que acabavam sempre com uns quantos feridos de arremessos de castanhas assadas. Um famoso Dia Mundial da Criança em que ao iniciar o cortejo da imagem de Maria, tudo preparado, levanta-se a estátua dentro da missa, e opah em frente, quando esta dá uma cabeçada no vão da porta e se parte em mil pedaços pelo chão, a mim parecia-me mau presságio, e não estava muito longe da verdade. Pois substituída Maria por uma versão mini e recomeça o cortejo pela escola, quando acaba toda a turma a escrever verbos na sebenta na sala enquanto olhávamos para as outras turmas pelas janelas que faziam aqueles joguinhos tão giros, por alguém ter gritado “Viva o Porto, Pentacampeão”, nos idos tempos do Jardel que aliás chegou a vir uma ou duas vezes a esta instituição; aliás estava eu a pensar fazer uma petição em prol de trazer cá de novo o Jardel que como todos sabemos está a passar por maus bocados e precisa do nosso apoio.

Tudo traumas saudáveis.

Foram bons tempos que ficarão para sempre marcados em toda a gente que cá está há mais tempo e que se lembra do lado antigo e aqueles que foram chegando. A verdade é que como todas as prisões acabamos por também nos afeiçoar quando lá estamos há mais tempo. Todas as viagens de estudo, celebrações, caminhos, brincadeiras variadas, vem tudo junto até este dia.

Quero agradecer a todas as pessoas que tornaram isto possível.

A irmã Aurora
A irmã Joaquina e todas as outras as outras bem amadas irmãs
As senhoras da cantina capazes de tanto fazer refeições que faziam toda a gente atropelar-se, crianças e velhinhos incluídos, só para poder comer o dobro e o triplo da dose de piza e frango no churrasco, como de fazer refeições que faziam toda a gente ir devagarinho e até dar o lugar. Aliás aproveito para fazer uma pergunta pertinente à direcção, podem dizê-lo agora que somos todos gente madura.
Afinal o que é que eram aqueles filetes de pescada? Queremos a verdade nua e crua, a minha teoria é que pegavam em pedaços de esferovite contraplacado, deitavam um pouco de manteiga só para dar um gostinho e lá faziam aquilo em quantidades maciças.
Ao senhor Neves
A todos os professores do 1º e 2º ciclo
A todas as vigilantes que tantos nos ajudavam a não nos magoarmos ainda mais ou até afogar-nos nas visitas à praia
A todos os jesuítas que cá vinham presentear-nos com canções e que pareciam vir directamente de uma clínica de toxicodependência, tão grandes eram as barbas e cabelo.
E àquele padre que quando uma vez, de maneira discreta, consegui ir confessar-me e a quem perguntei como podia ser melhor pessoa me olhou directamente nos olhos e me disse que a primeira coisa que devia fazer era pedir aos comunas dos meus pais que me baptizassem.

O show acabou, vai cair o pano, vocês foram todos grandes actores e desejo-vos o melhor, todos o merecem por ter sobrevivido. Obrigado e boa noite.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

(ilustração de raquel marin)


fazes das minhas costas o mapa do mundo.

domingo, 15 de novembro de 2009

(ilustração de josh cochran)

quem disse que o caótico não pode ser belo?

nunca uma madrugada desceu tão abruptamente.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009


um adeus português

Nos teus olhos
altamente perigosos
vigora ainda o mais rigoroso amor
a luz dos ombros pura e a sombra
duma angústia já purificada
Não tu não podias ficar presa comigo
à roda em que apodreço
apodrecemos
a esta pata ensangüentada que vacila
quase medita
e avança mugindo pelo túnel
de uma velha dor
Não
podias ficar nesta cadeira
onde passo o dia burocrático
o dia-a-dia da miséria
que sobe aos olhos vem às mãos
aos sorrisos
ao amor mal soletrado
à estupidez ao desespero sem boca
ao medo perfilado
à alegria sonâmbula à vírgula maníaca
do modo funcionário de viver
Não
podias ficar nesta casa comigo
em trânsito mortal até ao dia sórdido
canino
policial
até ao dia que não vem da promessa
puríssima da madrugada
mas da miséria de uma noite gerada
por um dia igual
Não
podias ficar presa comigo
à pequena dor que cada um de nós
traz docemente pela mão
a esta pequena dor à portuguesa
tão mansa quase vegetal
Mas tu não
mereces esta cidade não mereces
esta roda de náusea em que giramos
até à idiotia
esta pequena morte
e o seu minucioso e porco ritual
esta nossa razão absurda de ser
Não
tu és da cidade aventureira
da cidade onde o amor encontra as suas ruas
e o cemitério ardente
da sua morte
tu és da cidade onde vives por um fio
de puro acaso
onde morres ou vives não de asfixia
mas às mãos de uma aventura de um comércio puro
sem a moeda falsa do bem e do mal
Nesta curva
tão terna e lancinante
que vai ser que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti

Alexandre O'Neill

a história deste poema é tão lancinante como as suas palavras. vale a pena descobrir.

terça-feira, 10 de novembro de 2009


hoje a ana luísa fez anos.
vadias em tempo de chuva.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

(ilustração de matteo perazzoli)

os sonhos como
tangerinas a derreter na lingua,
E perguntas-me se todas as rugas valem o fim do mundo.

“Na civilização mecânica,
não há mais lugar para o tempo mítico,
senão no próprio homem.”

Lévi-Strauss, Antropologie Structurale

um dia destes perdi-me horas na biblioteca a ler 'O mito individual do neurótico' de Lacan, mais para me perder em Lévi-Strauss, (a obra parte da seguinte premissa do antropólogo: a interpretação freudiana do mito grego (Édipo) é ela própria uma versão desse mito), do que na psicanálise.
achei absolutamente apaixonante o modo como este senhor se debruçava sob os ritos mais ancestrais e longínquos da civilização moderna para explicar aquele que será provavelmente, um dos últimos mitos da nossa 'sociedade quente' - a psicanálise e, em última instância, a psicologia.
cheguei a casa e enquanto contava à minha mãe a minha descoberta mais feliz dos últimos tempos, aparece no telejornal a imagem de Lévi-Strauss : "(...) morreu de ataque cardíaco em Paris na noite de sexta para sábado, (...) o antropólogo social mais influente da segunda metade do século XX(...)".
é caso para dizer que Lévi-Strauss nasceu para mim no dia em que morreu.
(nostalgia, ilustração de gabriel pacheco)


(...)
O ciúme dói do leito à margem,
dói pra fora na paisagem,
arde ao sol do fim do dia.
(...)

caetano veloso, 'dor de cotovelo'

sábado, 7 de novembro de 2009

por casa, portanto.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

(e é verdade, tenho mesmo de voltar a pegar na lomo)

O nosso amor arrasou cidades. Éramos
muito jovens e pensávamos assim.
O mundo pertencia-nos. Ninguém
percebia mas nós vivíamos contra
tudo - era um acto político.


Assim alguns seres no mundo
construíram vidas, amaram
e sofreram isolados, por vezes
espoliados, queimados na fogueira.


Mas o nosso amor resistirá
às fronteiras, aos muros de fogo
e à injustiça. Gostaríamos de viver
o tempo da verdadeira transformação,
da felicidade universal.

Isabel de Sá

sabes que ainda acredito.
"Luz, mais luz.", já dizia Goethe.

hoje também peço luz.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

lindo, lindo.

(ilustração de matteo perazzoli)
(ilustração de violeta lopiz)

porque não há dia em que as paredes do quarto não encolham um pouco mais.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

(ilustração de romy bluemel)

"A alegria deseja-se a si própria, deseja a eternidade, a repetição das mesmas coisas, deseja que tudo permaneça eternamente semelhante."

Nietzche
sentados à mesa
esperamos pelos hábitos canibais da noite,
esquecemos que as cadeiras têm pernas para abrir
e devoramos todas as coordenadas do mundo,
o trigo ao fundo dos olhos
como se entrasses e saísses calado

como se toda a noite estivesse por nascer.

domingo, 1 de novembro de 2009


(ilustração de Cristina Sampaio)

a primeira boa resposta que li/ouvi:

"(...)
É assim tão difícil ler o texto no seu contexto? A pequena narrativa na grande narrativa?
José Saramago terminou, na SIC, por dizer: "Na Carta das Nações Unidas falta a enunciação de dois direitos: "o direito à dissensão e à heresia". Se por dissensão entendemos o direito à diferença, política ou religiosa, já lá está, e quanto à heresia, como me pronunciei então, José Saramago pode ficar totalmente em paz porque só é herege quem é crente. Quanto ao mais, agradeço o convite que me fez, reiterado pela sua mulher, a quem dedica o livro ("A Pilar, como se dissesse água"), para o visitar em Lanzarote."

Joaquim Carreira das Neves, no Expresso
(versão integral em http://aeiou.expresso.pt/caim-a-desilusao=f544686)
a semana foi louca, da melhor das maneiras.
não posso definitivamente queixar-me da vida universitária, dois concertos numa semana, muito passeio e jantares com amigos, e ainda sobrou tempo para ir às aulas e trabalhar um bocadinho. não gosto particularmente da vida nocturna (prefiro, por exemplo, um bom pequeno almoço acompanhada) mas é viciante o modo como podemos alargar os nossos dias, como se o tempo esticasse à nossa medida.

claro que depois de uma semana de prioridades trocadas, o sábado chega e com ele uma incrível dor de cabeça e incapacidade de fazer o que quer que seja da parte da manhã. quinta no plano b com a banda onde a ana luisa cantou e ontem mariza com as pessoas de sempre, (e o sempre sabe tão bem dizer) - dificilmente se esquecem noites tão cheias de imprevistos deliciosos.
apanhei às duas o autocarro para vir para casa, e a solidão soube particularmente bem. com mais tempo e dinheiro deixava-me ir até onde o autocarro me levasse para ir ver o nascer do sol a um sítio longe de todos os que conheço.

agora domingo, e insisto em ficar por casa, porque durante a semana os meus pés sentem a falta de pantufas.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

sempre sonhei quase todas as noites, e é raro não me lembrar (pelo menos a curto prazo) das imagens, das palavras, dos sons e das personagens. mas sobretudo das histórias.
o facto de sonhar frequentemente obrigou-me, inevitavelmente, a viver bem com as recordações mais tétricas ou desconfortáveis que se possa imaginar e era capaz de jurar que isso teve também algum papel naquilo que sou hoje.

e depois, numa perspectiva mais poética, há imagens que não esquecemos.
hoje por exemplo, sonhei que de castigo por qualquer coisa que não me recordo agora, era obrigada a cortar as falanges de 9 dedos. ainda me lembro de olhar incrédula para os meus dedos sem unhas, de superfície plana e arestas duras e cilíndricas.
depois à tarde, na oficina de escrita, a conversa sobre a minha visita ao teatro anatómico (um dia destes terei mesmo de falar disso em pormenor).
no seguimento disso, o jorge melícias mostra-nos um fotógrafo, Joel-Peter Witkin, que usa cadáveres nas suas composições.

entre o sonho e anatomia:
irrita-me esta indecisão entre a chuva e o sol.
não gosto da humidade nem de chegar a casa encharcada, mas já que é tempo de chuva, que venha ela, já estou de malas e bagagens para o próximo inverno e não me apetece esperar mais à porta do aeroporto.
encontro não encontro no youtube a balada da rita, cantada pelo sérgio godinho, deixo a letra:

"Disseram-me um dia, Rita (põe-te em guarda)
aviso-te, a vida é dura (põe-te em guarda)
cerra os dois punhos e andou (põe-te em guarda)
e eu disse adeus à desdita
e lancei mãos à aventura
e ainda aqui está quem falou

Galguei caminhos-de-ferro (põe-te em guarda)
palmilhei ruas à fome (põe-te em guarda)
dormi em bancos à chuva (põe-te em guarda)
e a solidão, não erro
se ao chamá-la, o seu nome
me vai que nem uma luva

Andei com homens de faca (põe-te em guarda)
vivi com homens safados (põe-te em guarda)
morei com homens de briga (põe-te em guarda)
uns acabaram de maca
e outros ainda mais deitados
o coveiro que o diga

O coveiro que o diga
quantas vezes se apoiou na enxada
e o coração que o conte
quantas vezes já bateu para nada

E um dia de tanto andar (põe-te em guarda)
eu vi-me exausta e exangue (põe-te em guarda)
entre um berço e um caixão (põe-te em guarda)
mas quem tratou de me amar
soube estancar o meu sangue
e soube erguer-me do chão


Veio a fama e veio a glória (põe-te em guarda)
passearam-me de ombro em ombro (põe-te em guarda)
encheram-me de flores o quarto (põe-te em guarda)
mas é sempre a mesma história
depois do primeiro assombro
logo o corpo fica farto

O coveiro que o diga
quantas vezes se apoiou na enxada
e o coração que o conte
quantas vezes já bateu para nada"

terça-feira, 27 de outubro de 2009

(ilustração de lonnie ruiz gómez)

quando acordo, a pergunta.
quando me deito, a pergunta.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

(the richest ornament II, ilustração de john ryan solis)

um mês,
sabes que gostava de contar o tempo como os fios de cabelo, um dia parar e dizer que este será o último a crescer, até que toda a cabeça se encha de um imenso e liso vazio e o último cabelo se esqueça de cair, uma espécie de acto heróico no meio de tanto esquecimento.
mas o modo algo impulsivo como os dias crescem (mesmo que passe 5 horas sentada num banco à espera de abrandar qualquer coisa) diz-me que não devo parar.
por isso vamos antes esperar que o cabelo cresça, o necessário apenas para que um dia os meus caracóis consigam percorrer a distância da minha à tua almofada.
Hitler comenta polémica com Maitê Proença

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

quando chega setembro, raramente penso no novo ano que vai começar.
não, do que eu me lembro mesmo é do natal - e sim, pertenço àquele grupo de pessoas que mesmo na maioridade faz planos para dezembro com meses de antecedência.
àparte as prendas e as corridas frenéticas e obcessivas das vésperas, qualquer coisa de muito primário em mim cresce quando começa a ficar frio - e apesar de odiar chuva, (é provável que a culpa seja mais da minha longa experiência com autocarros que outra coisa), se chover em novembro ou dezembro fará todo o sentido para mim andar na rua à procura (e sempre com antecedência, por isso livro-me da corrida frenética e dos preços exorbitantes) das prendas que vou dar.
ultimamente perco-me frequentemente em livros de receitas porque antecipo os meus cozinhados com a mesma expectativa prolongada com que antecipo o natal, para além de, claro, juntar uma coisa a outra, como seria inevitável.
aqui fica uma das receitas que obrigatoriamente terei de fazer, até porque não vão ser poucos os jantares/lanches/almoços natalícios, entre família e amigos:

bolo de chocolate com frutos encarnados

200g de chocolate
50g de manteiga
1/2 litro de natas
200g de doce de framboesas
1 gema
200g de bolachas
200g de frutos encarnados
50g de açúcar

triturar a bolacha e misturar com a manteiga derretida para fazer a base.
derreter o chocolate com a manteiga em banho-maria e juntar o doce de framboesa, a gema e as natas. deixar em banho-maria durante cinco minutos e deitar este preparado em cima da base de bolacha.
decorar com os frutos encarnados preciamente fervidos com o açúcar.

acreditem, iam querer ver a imagem do livro.


há poucas músicas que me acordem tanto a alma como esta, principalmente se for cantada pelo bob dylan.
mas como não encontrei a versão que queria, decidi pôr esta, ligeiramente mais divertida.
para ver se a chuva não custa tanto.
alguém que me leve a Provence?

quarta-feira, 14 de outubro de 2009


"(...)
E à alegria diurna descerro as mãos. Perde-se
entre a nuvem e o arbusto o cheiro acre e puro
da tua entrega. Bichos inclinam-se
para dentro do sono, levantam-se rosas respirando
contra o ar. Tua voz canta
o horto e a água - e eu caminho pelas ruas frias com
o lento desejo do teu corpo.
Beijarei em ti a vida enorme, e em cada espasmo
eu morrerei contigo.”

todos os dias, invariavelmente, 'o amor em visita' e não cessam os espasmos.
ou os beijos, ou a morte.

boa noite amor meu.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

CALENDAR GIRLS




(L-R) Tricia Stewart, Angela Baker, Beryl Bamforth, Lynda Logan, Chris Clancey and Ross Fawcett pose for photographers at the launch of their 2010 nude calendar Photo

The original "Calendar Girls" have taken their clothes off for charity again 10 years after they first inspired a Hollywood movie and started a national craze for nude calendars.
Wearing little more than a smile and a trademark set of pearls, six members of the Yorkshire-based Women's Institute have been reunited for a new 2010 calendar.
The youngest of them, Chris Clancy, is now 57; the oldest, Beryl Bamforth, is 75. They are pictured in typical WI scenes, their modesty protected only by a baby-grand piano, a tea pot and sprouting broccolli on a vegetable patch.
Angela Baker, 63, whose husband's death from lymphoma led to the idea for the first calendar, was surprised that people were celebrating their reunion.
"Thank you for coming," she said. "We were a little worried whether anyone would turn up 10 years on but it has been brilliant to see you are."
With a combined age of 379, the women are perhaps old enough to know better by now. But Mrs Baker suggested not and said she could not rule out another calendar in the future.
She said: "I think if we're all still there, and we didn't look too awful ... [but] we would definitely have to have bigger props."
When they made the original calendar in 1999, the women's ambition was to generate enough money to buy a sofa for a hospital waiting room.
But over the next decade, they found themselves travelling the world, being portrayed in a West End play and by Dame Helen Mirren in a film, and have now raised around £2 million for Leukaemia Research.
Meanwhile, almost every WI, fire brigade and sports team in the country have followed their lead.
The 2010 calendar is the first to be shot in colour rather than sepia.
Mrs Baker, 63, who can be seen playing the piano in February, said: "I was a bit apprehensive about colour, because older women can look a bit funny in colour, and we wanted it to be just as good as the first one.
"Then, when I did see it in colour, I thought 'Well, maybe, why not?"'

(retirado de telegraph.co.uk)´

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

(to bury future lovers, ilustração de ray jones)


e um dia aprendi como é fácil perder-me por todos os quartos do coração.
quando era pequena os meus pais ainda faziam viagens de dias e dias pelo interior de portugal, comigo enroscada no banco de trás a suar com o calor do alentejo.
numa dessas viagens intermináveis a minha mãe comprou uma cassete de fado, e viemos a ouvir a amália incessantemente - foi assim que uma menina de cinco anos aprendeu a trautear fados inteiros.
cresci a gostar de amália com um afecto muito grande e primário, e do mesmo modo que dificilmente compreendemos línguas diferentes, nunca percebi bem como é possível não querer essa coisa estranha e visceral que é a saudade.

no outro dia um professor de psicologia social disse-me, a propósito de um projecto de investigação, 'estamos a tentar encontrar a definição científica de saudade', e eu pensei, perplexa: este senhor nunca ouviu amália.

e não há nada mais cientificamente português do que o NOVO FADO DA SEVERA (aqui cantada por dulce pontes), a música que nunca me saiu do ouvido, (com ou sem dez anos de morte de amália).

terça-feira, 6 de outubro de 2009


(ilustração de romy bluemel)

ando há cerca de uma semana à procura de um garfo.
é mesmo isso, falta-me um garfo, não sei como o perdi, só que me tem sabido mal o pão e a água e outras coisas que uso para viver.
nunca pensei que aquilo com que levas a comida à boca se tornasse, de repente, o alimento.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

(ilustração de gustavo aimar)


Sobre a 'alegada hipertrofia da individualidade entre a juventude actual'
(só porque os títulos demasiado grandes dão aquele ar intelectual de tese),
na Super Interessante deste mês:

"(...) se há algo que representa essa alegada hipertrofia da individualidade entre a juventude actual é a proliferação dos blogues. Os diários digitais transformaram-se na forma predilecta de falar de si próprio enquanto se comunica com os outros de forma totalmente livre. John Hiler, editor do Microcontent News, uma publicação online sobre notícias da blogosfera, afirmava: "Existe algo no formato que estimula um desenvolvimento quase canceroso do nosso ego." (...)

não sei se esta 'alegada hipertrofia da individualidade entre a juventude actual' pertence só à juventude, ou só à juventude actual, ou a nenhuma das duas.
há qualquer coisa que mexe comigo quando ouço expressões como 'a juventude de hoje' - uma criança, um adolescente, um jovem adulto, um adulto ou um idoso nunca deixam de ser a classe representativa da sua época - e com todas as condicionantes que essa época implica, uma criança não deixa de ser uma criança, e o mesmo se aplica ao resto.
de resto, quando se fala da ingenuidade com que os adolescentes/jovens adultos de hoje se arriscam a investir em cursos que 'não dão nada': não acredito que alguém que tenha crescido, como eu, a ouvir que a inflação das qualificações não vai parar de subir, que vai ter de trabalhar a recibos verdes para ganhar experiência, se, com muita sorte, conseguir emprego depois, e que, em suma, teve um azar dos diabos para ter aparecido no mercado de trabalho logo quando todas as hipóteses de sucesso se esgotaram; não acredito que se invista por ingenuidade, a não ser que a ingenuidade seja uma forma de coragem.
e desse ponto de vista, quem agora não precisa de um desenvolvimento quase canceroso do seu ego para tirar um curso de design, de cinema, de psicologia ou de culinária?

e que bom que, (com mais ou menos ego), entre os filhos da geração que nunca deixou de chorar o sonho imperfeito de Abril, ainda há gente corajosa.

sábado, 3 de outubro de 2009

(ilustração de gabriel pacheco)

sabes que fecho os olhos e vejo-te assim, nu na perplexidade de nos ter escapado o rumo do mundo, como se já não bastassem as órbitas dos planetas ou a lei da gravidade para saber quando nos vai cair o céu.
depois sorris devagarinho e pedes que te plante outra semente no lugar da rosa arrancada.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

hoje de manhã ao sair de casa, pensei:
há qualquer coisa quase nua no calçar sapatos de verão que faz com que esse seja o meu primeiro acto de liberdade do dia, e esta será provavelmente das última vezes em que o poderei fazer.

saí de casa na fatalidade de vir a ter frio nos pés nas esperas de paragem de autocarro (agora gosto de chegar bem tarde para adormecer depressa), mas teimosa na minha despedida.

as sextas feiras são o meu dia da não-expectativa: sem aulas, não há nada que não possa fazer. em contrapartida acabo por ter de gerir a dificuldade em esquecer que gosto de olhar todos os dias para a agenda.
apesar de ter tomado pequeno-almoço com o xico, almoçado com ele e com o fidos (até hoje, os homens mais estáveis da minha vida), termos passado a tarde no salão barulhento do s.joão, depois reunião de urgência da AE e finalmente caffè di roma de fim de tarde com a ana luísa, apesar de, não tendo feito grande coisa, ter feito muita, cheguei a casa com o peso esmagador das mãos vazias.

de hoje fica-me a primeira sensação de outono,
as nuvens carregadas como insónias a amedrontar-me o sono.

preciso de comprar calçado de inverno.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

velocidade.
demasiada velocidade.